JusPatrimonial - Em alguma fase da vida muitas pessoas se tornarão herdeiras, se deparando com a necessidade de resolver o inventário para que possam legalmente tomar posse, usufruir ou vender um bem.
Existe um certo senso comum sobre o que é o inventário. Até mesmo em relação aos impostos, muitas pessoas têm pelo menos a noção de que existe tributos sobre a herança.
Entretanto poucas pessoas conhecem os riscos de não resolver um inventário, seja pelo preconceito contra o herdeiro que tem pressa de iniciar o procedimento logo após o falecimento de um familiar ou ainda pela falta de publicidade sobre a legislação que por um lado penaliza os herdeiros e por outro lhes concede prazos curtos para iniciar o inventário isentos de punições, mesmo diante da fragilidade que o herdeiro pode se encontrar após uma perda familiar.
O advogado Breno Watzeck, sócio do escritório Watzeck Advogados e especialista em inventários, assumiu a responsabilidade de evitar prejuízos dos herdeiros ao publicar dezenas de artigos em seu site informando gratuitamente sobre o tema.
O especialista procura educar a sociedade e seus clientes para evitar críticas contra os herdeiros que conseguem forças para decidir pelo início rápido do inventário dentro prazo legal ou pelo menos o mais rápido possível. Também alerta sobre as repercussões negativas sofridas pelos herdeiros quando demoram ou cometem práticas juridicamente não recomendadas neste tipo de processo.
Com exclusividade para o JusPatrimonial nesta entrevista o advogado Breno Watzeck trouxe para nossos leitores suas lições mais valiosas até então pouco esclarecidas no meio jurídico, mesmo com tantas possibilidades de prejuízos para os herdeiros.
Dr. Breno, vamos começar pelo básico. Para que serve o inventário?
Inventário é o procedimento jurídico, realizado de forma judicial ou extrajudicial, que permite a transmissão dos bens deixados pelo falecido aos seus herdeiros. Os bens, direitos e dívidas serão levantados, avaliados e conferidos para que sejam transmitidos aos herdeiros beneficiários ou direcionados a suprir eventuais credores.
E qual o prejuízo do herdeiro que não inicia o inventário?
Conforme a lei prevê, o herdeiro pode ser multado ou até mesmo perder a herança se ela for considerada herança jacente.
Em seu site o sr. tenta derrubar o preconceito contra os herdeiros mais apressados. Quando essas críticas acontecem?
Muitos conhecidos ou familiares criticam quando algum herdeiro procura um advogado logo após o falecimento de alguém. Há uma ideia errada de que essas pessoas não estão comovidas com a perda ou não tiveram apreço pelo falecido e que só estão interessadas na herança.
Seja como for, a própria lei empurra o herdeiro para iniciar o inventário antes do curto prazo de 60 dias, independentemente se as partes ainda estão abaladas ou não.
A lei sobre heranças, pelo menos nesse sentido, faz as pessoas seguirem a vida. Procuro orientar os herdeiros que uma das formas de honrar a vida do falecido é não desperdiçando seu árduo trabalho para acumular a herança, usando-a com sabedoria e rendendo mais frutos, ao contrário de lapidar a herança pagando multas ao governo ou até colocando todo o patrimônio em risco.
Vivemos num país emergente onde muitas pessoas conquistaram um patrimônio inédito na família. Nesse contexto, o esforço de uma vida muitas vezes é dedicado pelo falecido para que seus herdeiros tenham mais oportunidades e conforto do que ele próprio usufruiu. Com seu falecimento é hora de concluir essa última vontade, tomando posse da herança da forma correta, se possível com os herdeiros em consenso, de forma rápida, evitando despesas desnecessárias, multas e deterioração.
É por isso que divulgamos essas orientações em nosso site, nas consultas e oferecemos o serviço de mediação de conflitos, para ajudar os herdeiros a resolver o inventário de forma amigável e retomarem rapidamente suas relações familiares.
"Fazer o inventário logo após o falecimento não é ganância, é prevenção!", afirma Breno Watzeck.
Os familiares precisam conhecer a inflexibilidade legal para se motivarem a iniciar o inventário o mais rápido possível. Me esforço para que a sociedade saiba que fazer o inventário logo após o falecimento não é ganância, é prevenção. O herdeiro que inicia o inventário rapidamente deve ser aprovado, pois normalmente é ele quem se tornará o inventariante que é a figura central no processo de inventário representando todos os herdeiros, assumindo essa tarefa extra enquanto supera o luto junto com todos os outros herdeiros e no final do processo todos se beneficiarão com sua atitude enérgica.
Qual a sua opinião sobre a legislação de inventários?
Por um lado, a lei é necessária, caso contrário poucos herdeiros resolveriam o inventário se não houvesse os prazos legais. Além disso, as regras legais são fundamentais para regular a partilha entre herdeiros, delimitar os direitos dos credores sobre herança, entre muitos outros aspectos da lei.
Minha maior ressalva é sobre o prazo mínimo para multar os herdeiros. Na minha opinião deveria passar de 60 para 90 dias, pois diversos herdeiros nos consultam para resolver o inventário com o prazo já expirado, pois sequer tiveram estrutura psicológica para pensar na herança nesse curto prazo ou não tinham conhecimento da multa.
Não existe nenhum trâmite automático após o óbito para notificar o herdeiro sobre a existência da multa em decorrência do prazo para iniciar o inventário. Muitas pessoas simplesmente não conhecem a lei.
Não é como uma notificação de uma multa de trânsito ou multa por atraso de um imposto que o cidadão sabe que tem que pagar no vencimento conforme consta na guia de pagamento. Ou o herdeiro conhece a multa do inventário ou não conhece. Nenhum órgão oficial avisa o herdeiro sobre isso, nem quando a família recebe o atestado de óbito. Por isso nosso escritório assumiu a função social de comunicar o máximo de pessoas para iniciar o inventário dentro do prazo.
Por que o sr. se preocupa tanto com prazos para iniciar o inventário?
Por exemplo, no Estado de São Paulo, a lei define o seguinte:
Quando alguém falece os herdeiros têm prazo de 60 dias para iniciar o inventário. Se exceder o prazo o herdeiro será multado em 10% sobre o valor calculado do ITCMD. Se o prazo ultrapassar 180 dias a multa aumenta para 20% sobre o valor calculado do ITCMD.
O sr. disse que um herdeiro pode perder a herança? Como isso é possível?
Se a herança for considerada jacente, ou seja, sem herdeiros formalizados, conhecidos ou legítimos a Prefeitura deve tomar posse da herança. É uma forma de dividir esses bens para toda a sociedade em vez de beneficiar apenas um privilegiado. Nesse caso a herança é leiloada e o valor é depositado nos cofres públicos ou se for possível é utilizada para alguma finalidade social, como creches, hospitais, escolas etc.
Quando um herdeiro não faz o inventário a herança pode ser considerada jacente. Tudo ocorre através de um processo jurídico para dar tempo e oportunidade para um herdeiro desavisado poder se manifestar e proteger sua herança não formalizada. Mas parte desse processo pode ser por divulgação no Diário Oficial se o herdeiro não for encontrado para ser citado. Aí que está a possibilidade de o herdeiro perder a herança e nem ficar sabendo, principalmente naqueles casos em que o bem não é ocupado pelo herdeiro. Quando ele descobre, já perdeu.
O inventário concluído é a única proteção definitiva. Se houver imóveis é altamente recomendável que o herdeiro registre seu nome na matrícula do imóvel colocando fim à possibilidade da sua herança ser considerada jacente.
Então todo herdeiro é obrigado a fazer o inventário?
Sim, se o herdeiro quiser evitar multas e evitar perder a herança deve obrigatoriamente fazer o inventário judicial ou extrajudicial. Não há outro procedimento legal que livre o herdeiro desses riscos a não ser o inventário. Portanto, vendo por esse lado, para se livrar da multa e evitar outros 7 problemas de quem não faz o inventário posso afirmar que o herdeiro é obrigado a fazer o inventário.
É incrível que isso aconteça. Com qual frequência esses problemas afetam os herdeiros?
Quanto à multa sempre acontece. É muito comum. Depois de decorrido o prazo não há como negociar. Só resta ao herdeiro pagar.
Quanto à perda do imóvel para a Prefeitura é algo mais raro, mas totalmente possível. Já atendi clientes procurando defesa, pois estavam sendo despejados. Uma pessoa assinou a citação e não entregou para o proprietário constituir um advogado e processo correu em revelia. Esse processo ainda está em tramitação, estamos defendendo os herdeiros.
Mas esses não são os únicos problemas.
Além da legislação, o que mais pode prejudicar o herdeiro?
O próprio mercado incentiva, regula e exige que o inventário seja resolvido.
Enquanto o inventário não for iniciado e o inventariante constituído, bancos impedem que o herdeiro movimente contas bancárias dos falecidos, imobiliárias suspendem o repasse de aluguel, escrituras de venda e compra não podem ser assinadas.
Muitos herdeiros perdem boas oportunidades de negócios por deixar o inventário para depois.
Pode até haver desvalorização de um bem se o inventário não tiver sido resolvido. Por exemplo, um imóvel é considerado "enrolado" quando o inventário não foi concluído. Por correr riscos com prazos muitas vezes indeterminados para conclusão dos inventários, o que afeta a liquidez do bem, os compradores interessados reduzem o valor das propostas. É uma praxe de mercado. Muitos herdeiros perdem boas oportunidades de negócios por deixar o inventário para depois.
Em alguns momentos o sr. disse que o inventário precisa ser iniciado. Ou seja, basta o início do inventário (e não a conclusão) para que o herdeiro se livre de diversos problemas?
Sim. É isso mesmo! A probabilidade de diversos problemas é reduzida e até eliminada simplesmente com o início do inventário, como a multa ou a perda da herança se for considerada jacente. Claro que a conclusão do inventário é importante, mas o início é fundamental para eliminar muitos prejuízos logo de cara.
O sr. disse que não há solução para os problemas do herdeiro além do processo de inventário. Mas e o planejamento sucessório?
Ótima pergunta. Alias, muitos herdeiros questionam isso...
Quando o dono do bem falece os beneficiários passam a ser considerados "herdeiros".
O planejamento sucessório é feito enquanto o proprietário do bem está vivo, por iniciativa dele mesmo, seguindo algumas normas legais. Neste caso os beneficiários são chamados de sucessores e não de herdeiros, e os bens não são considerados herança, pois não há falecido.
Para transferir os bens aos herdeiros a solução é o inventário. Já aos sucessores a solução é o planejamento sucessório. É só uma questão de "timing" e de nomenclatura jurídica.
De certa forma, o planejamento sucessório livra o "futuro herdeiro" de fazer o inventário através da doação formal ou a implementação de holding familiar. Entretanto há alguns casos que a lei impede que o dono do imóvel disponha em vida de 100% de seus bens, como imóveis. Por isso, sempre vai restar algum bem, mesmo de menor valor para que o herdeiro receba através do inventário judicial ou extrajudicial.
De forma básica o planejamento sucessório consiste em distribuir os bens para os sucessores enquanto o proprietário está vivo. Em termos custos, fica um pouco mais barato fazer o planejamento sucessório do que o inventário, além de poupar os herdeiros de discussões futuras e encurtar prazos.
O que o herdeiro deve fazer para resolver um inventário?
Além do advogado, o herdeiro tem funções importantes no processo de inventário que podem agilizar o atrasar o processo.
Na fase inicial a primeira coisa é consultar e contratar um advogado. Seja para o inventário judicial ou extrajudicial é obrigatório por lei a supervisão de um advogado particular ou da Defensoria Pública.
Depois deverá definir quem será o inventariante, ou seja, a parte que representará os herdeiros e listará os bens do espólio.
O inventariante pode ser um herdeiro ou um administrador, por exemplo, não precisa necessariamente ser um dos herdeiros. Depois entregar os documentos que o advogado solicitará conforme o caso.
Por que a lei exige que o herdeiro contrate um advogado no processo de inventário?
Por conta da complexidade do processo a lei exige que haja pelo menos um advogado no processo de inventário.
Afinal, só um advogado pode recomendar ao herdeiro qual será a melhor modalidade para seu caso dentre as opções de inventário judicial ou extrajudicial, pois elas essas modalidades se diferenciam em razão das despesas, prazo e burocracia, dependendo do caso. Há situações ainda que nem é possível resolver de forma extrajudicial, devendo obrigatoriamente recorrer à justiça. Em outros casos é recomendável optar pela esfera judicial para cortar gastos.
Há certidões que precisam ser emitidas. Muitas vezes há atestados de óbitos para serem corrigidos.
O inventário é o processo final. Quase sempre envolve outros ramos, como o Direito Imobiliário, normas, estatutos e procedimentos técnico-jurídicos. É preciso emitir certidões e verificar se o imóvel possui dívidas ou restrições e quando existem, é preciso solucioná-las.
Acredito que o principal motivo do advogado ser obrigatório é para garantir que todos os herdeiros tomem posse da sua parte conforme a lei, sem privilegiar um herdeiro em prejuízo de outro. E isso só acontece quando todos os herdeiros receberam orientação jurídica sobre qual o seu quinhão conforme a lei.
Além disso, um processo de inventário gera repercussões fiscais, legais, tributárias e até criminais. Tudo isso precisa ser orientado por um advogado particular ou da Defensoria Pública se o herdeiro comprovar que não tem condições de pagar.
Como reduzir custos no inventário?
Quando o herdeiro está bem orientado por um especialista normalmente economiza e evita muitos problemas no inventário.
O advogado experiente sabe a hora certa de emitir certidões, pois elas podem vencer gerando novos custos aos herdeiros.
"Um herdeiro bem orientado, poupa custos e usufrui legalmente de seus direitos", diz o advogado.
O ideal é que o herdeiro inicie o inventário no prazo para evitar multas. No lugar da multa é possível até conseguir um desconto no imposto de pago dentro do limite legal.
Além disso, jamais deve mentir ou omitir informações ou bens dos outros herdeiros ou do advogado. Entregar rapidamente a documentação que o advogado solicitar e principalmente conseguir um acordo de partilha entre as partes. As divergências entre os herdeiros sempre corroem a herança e prolongam o prazo da conclusão do processo.
Fale com o Especialista: Breno Watzeck
Breno Watzeck é advogado especialista em inventário e atua no escritório Watzeck Advogados. Possui um blog sobre inventários e publicou o ebook: "Guia para Herdeiros Regularizar o Inventário".
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